quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Têm dias...

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Ontem, apanhei uma moça na porta do HTO...

Braço na tipóia...

- Por favor, tenta evitar buracos...

- Vou tentar...

Resolvi entrevistá-la tomando cuidado de avisá-la sobre meu famigerado blog...

Ela foi respondendo...

Acidentou-se num acidente automobilístico...

Estava no banco traseiro do veículo...

- Com ou sem cinto?

- Sem...

Na realidade estava à bordo de um bugre ziguezaguendo em dunas...

- Cabo Frio, Arraial, Natal?

- Nada! Emirados Árabes...

Quase todos por lá possuem cicatrizes de acidentes equivalentes...

Conta que vive na Califórnia...

É cineasta...

Está nos Emirados para finalizar parceria para realização de um filme de animação...

É casada com engenheiro e não tem filhos...

Quero saber sobre a sociedade e costumes por lá...

Já aprendeu a separar seu tapetinho e orar em direção à Meca...

Se adaptou...

Oitenta por cento dos habitantes dos Emirados são estrangeiros, 20% emirates...

Não sabe a população total do país...

Nem eu...

Deve ser algo como cinco milhões, ou dez...

Chegamos, sem sacudir muito...

- Taí, gostei!

- Eu também, quando sair o filme me avisa!

...


Uma senhora acaba de atender o celular...

Desliga...

Sem eu perguntar, me comunica que um de seus filhos...

Já casado e com mais de 40 anos de idade....

Mesmo assim depende dos conselhos da matriarca...

Por que?

Ficou viúva muito cedo...

Seus dois filhos ainda tinham seis e oito anos de idade...

Seu esposo morreu em 1971...

Como?

Ele pertencia a Esquadrilha da Fumaça...

Retornava de uma apresentação em Minas Gerais...

Seis aviões em formação...

A esquadra resolveu saudar um comandante que estava no solo...

Dois aviões se chocam na improvisação desastrada próximo de Nova Iguaçú...

Quatro pilotos morrem na hora...

Incluindo seu esposo...

Não processou a Aeronáutica quase em homenagem ao esposo que era muito amigo do tal comandante...

Se arrepende...

Embico naquela rampa da Casa de Suíça...

Entra ao lado da portaria do Restaurante...

Chato ter que transportarmos mortos insepulcros para sempre...

...

Um italiano de Roma embarca no final da Urca quase em frente ao Forte...

Fala pouco português...

Se esforça...

Conseguimos sintonia fina num linguajar paralelo...

Faz tempo que não apanho engarrafamento tão espetacular...

Está indo apanhar a filha naquele colégio ali da Visconde do Rio Preto...

Tento chegar pela Menna Barreto...

Desisto...

Retorno pela Praia de Botafogo mesmo...

Acesso pela entrada da Farani e entro abaixo do viaduto ao lado da Igreja Imaculada Conceição...

Ufa...

Me proporcionou conhecer meu passageiro...

Trabalha para empresa televisiva...

É correspondente...

Seu patrão?

Berlusconi....

Berlusconi está no poder há 10 anos...

Não tem intenção de desocupar tão cedo...

É algo como uma quase ditadura branca...

Berlusconi não está sozinho na Europa...

Felipe Gonzalez controlou a Espanha por 14 anos seguidos de fabulosa prosperidade e só foi defenestrado pela compreensível salutar alternância do Poder...

Acabo recordando do incidente dos três travestis brasileiros envolvidos com o governador da região de Lázio...

O tal governador era casado com linda apresentadora de TV e com duas filhas de algo como vinte anos de idade...

Sua esposa?

O perdoou...

O cargo?

Perdeu...

Os travestis?

Um deles apareceu morto e incendiado no melhor estilo carabiniero de ser que nada perde a banda podre de nossas paragens...

Meu passageiro tinha tantas informações, opinião e conhecimento que acabou ótimo o passeio engarrafado...

Apanha sua filha na porta da Escola...

A menina tem oito anos...

Fala italiano rápido e português ótimo...

Páro no sinal...

Um magro, sempre lá vendendo jujubas chega ao lado de meu vidro...

Venta, chuvisca fino...

- Três por um real!

Alcanço dois reais e pego...

As jujubas redondas soltam açúcar na embalagem...

Pergunto se a menina aceita uma...

Fica tão feliz que me atrevo lhe entregar todas três...

Ela quase não acredita na oferenda...

Nem eu imaginaria que a menina ficaria tão feliz...

Aquela bala é muito ruim...

Quer dizer...

Quando eu era criança adorava...


...

Um travesti...

Rua da Lapa altura do 120...

Muito feio...

Uma caricatura de si mesmo...

- Rua dos Inválidos, Hotel Fluminense...

- Ok!

Seu telefone toca o tempo todo...

Uma música estridente e chata...

O tempo todo...

No pequeno percurso, tocou pelo menos dez vezes...

Chato, muito chato...

Engraçado...

Prostituta modernosa sempre possui rádio nextel...

Já traveco, ainda não descobriu a nova tecnologia mais barata e eficaz...

Deveriam...

Nas inúmeras ligações atendidas fico cismado do bagulho doido variar entre 100, 120, 150 e 200 reais por hora de colóquio clandestino...

O travesti me esclarece que em função do preço do Hotel...

Quando é no Diamond ele não cobra o táxi, já que pode ir caminhando até...

Vejam só...

Seu objeto de desejo chegar até você gastando salto pelas calçadas irregulares...

Corta qualquer magia...

Me recuso a entrar em miudezas escatológicas alheias...

Porém, deve ter relação com algo de preferências...

Quando o travesti salta do carro fico olhando o nordestino vestido de mulher...

Imagino ela batendo na porta do sujeito todo-todo feliz que se depara com aquilo bizarro...

Sei lá?!

Depois de tudo complementado só lhe resta cair na real...

Sentar no primeiro meio-fio e chorar...

Muito!

Tudo!

Na real, na real...

Mesmo que fosse a mulher mais formosa do mundo...

E mulher mesmo, na acepção de anatomia e sentimentos...

Se combinar preço previamente?

E o sujeito aceitar?

Melhor encontrar outras fórmula à sublimar sua baixa estima...

Que tal um tatú?

Problema que dá dor nas costas...




Jorge Schweitzer






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