Assoviava o vento de campanha na minha janela veneziana de madeira...
Com seu som e halo mágico...
Esvoaçando a cortina transparente a jorrar cheiro de anil...
Muito antes do clarear...
Assoprando nuvens algodão imensas nos pampas...
Visualizava o fenômeno sonolento...
Maldizendo aquele horário de lobisomem...
O gemido da natureza trocando de horas...
No rádio valvulado, músicas sacras...
Pôs bueno...
Minha avó Pequena chegava no quarto...
Com seu cigarro Continental sem filtro entre os dedos...
Com suas mãos cheias de pintas me vestia a bombacha quadriculada...
Camisa branca dura engomada...
E lenço vermelho no pescoço...
Estava vestido de ‘grosso’...
Tomava um café com leite cheio de nata...
Que minha mãe se negava coar...
Na porteira a tropa aguardava com seus cavalos soltando fumaça quente pelas ventas...
Encabulado tinha dificuldades ao subir no pingo arisco...
Um petiço marchador...
O cusco barulhento ladrava idiota tentava morder o calcanhar da montaria atrapalhando ainda mais minha manobra...
A contragosto, com a bochecha vermelha, dava adeus à minha família emocionada...
Como se estivesse partindo como um “Voluntário da Pátria” para uma “Guerra dos Farrapos” das minhas aulas de História...
Galopávamos...
Arrastaando arreios chacoalhantes à caminho da colheita de “Macelas”...
Uma tradição gaúcha da Sexta-Feira da Paixão...
Recolhíamos o mato alto dentro de sacos alvos farinha de trigo antes do dia explodir seus últimos raios nos barrancos entre as montanhas e o céu...
Num clarão avermelhado cortando o puro azul do Rio Grande...
Evitávamos o frescor da geada noturna a afugentar a pureza das plantas sagradas...
Numa Sexta-Feira Santa de lembranças debruçadas no canto empoeirado da alma...
Ondulando recordações adultas a renovar momentos da ilusão de ser feliz...
Voltando a ser guri...
Jorge Schweitzer
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